quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Esopo, Liberdade e Esperança

Fui aluno do Pedro II, o antigo Colégio-Padrão, no Rio de Janeiro. Boas recor­dações guardo dos mestres Homero Dornelas (1901-1990), assessor do genial Heitor Villa-Lobos (1887-1959); Honório Silvestre; José Jorge (1921-2006); Newton Gonçalves de Barros (1915-1997); Pompílio da Hora; Sá Roriz; Farina; Choeri (1925-2013); Sebastião Lobo; José Marques Leite; Fernando Segismundo (1915-2014), ex-presidente da Associação Brasileira de Imprensa, a nossa ABI; e outras notabilidades nacionais.
Lá estudávamos as páginas de Esopo, Fedro, La Fontaine
Fábulas, todos sabem, são narrativas em que os animais falam, acertam ou se equivocam, possuem sabedoria ou empá­fia. Enfim, singularizam os homens com as suas qualidades e defeitos. Esopo, um cativo grego na ilha de Samos, viveu há mais de 2.500 anos e era campeão em contar essas historinhas, que sempre nos convidam a refletir. Uma delas é:

O CÃO E O LOBO
Vinha um cão por uma estrada. De súbito, deu de frente com um lobo, que lhe disse:
— Amigo, estás com uma excelente aparência! Forte, lépido, feliz. Sinto até inveja de ti…
— É mesmo?! Faze então igual a mim. Consegue um dono bondoso. E terás alimento nas horas certas e serás bem-cuidado. Meu único serviço é, se aparecerem assaltantes, latir à noite. Vem, pois, comigo e ele te dará semelhante trata­mento.
O lobo considerou a proposta muito boa e foi acompanhando o cão no caminho de casa. Até que, a um dado instante, um fato despertou a sua curiosidade.
— Que é isso pendurado em teu pescoço? Estás machucado?
— Bem... — respondeu-lhe o cão — é por causa da coleira.
— Quê?! — espantou-se o lobo…
— De dia, meu senhor me prende com ela. Não quer que eu apavore as pessoas que o visitam.
Ouvindo isso, o lobo não quis mais conversa e abandonou o cão no meio do trajeto, todavia não sem antes lhe dizer: — Amigo, esquece tudo, porque não te seguirei mais. Acho melhor viver liberto do que na tua aparente abastança.

MORAL DA HISTÓRIA E LIÇÃO DE JESUS
Não há ouro suficiente que valha a liberdade, que, para ser correta, invoca responsabilidade. E, assim, o velho filósofo da Hélade, que era mentalmente livre, embora padecesse a ignomínia da escravidão, legou-nos, entre outros, esse grande preceito. Contam que o seu senhor, espantado com tamanho saber, lhe deu carta de alforria.
O ensinamento de Jesus é superior ao do fabulista. Encontra-se no Evangelho, segundo João, 8:32: “Conhecereis a Verdade [de Deus], e a Verdade [de Deus] vos libertará”. Eis a diferença — a verdade dos homens, em geral, costuma deixá-los malogrados, porque às vezes é apenas razão, que pode variar conforme os mais diversos fatores, incluídos os de longitude e latitude, apesar da globalização infrene. A de Deus, porquanto razão embasada na Justiça e firmemente no Amor, por conseguinte distante de fanatismos ou certas espécies de convicções radicais, eleva-os ao esclarecimento maior, até nas dúvidas mais recônditas, premiando-os, quando justos, pacientes e pertinazes, com a emancipação que não os surpreenderá, adiante, com as mais tristes frustrações. Isso ocorreu a célebres pensadores que viram suas certezas abaladas, ou mesmo derruídas, com o estremecimento de ideologias brilhantes, porém pouco eficazes. Entretanto, como esclareceu Lavoisier (1743-1794): “Na Natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”. Ninguém é culpado, sendo crente ou ateu, por realmente querer o melhor para o povo.

José de Paiva Netto — Jornalista, radialista e escritor.

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