Em uma série de ataques recentes no Iraque,
militantes sunitas e jihadistas do Estado Islâmico do Iraque e do Levante
(Isis, na sigla em inglês) tomaram o controle de cidades importantes, além de
poços de petróleo e de fronteiras no norte do país. A BBC entrevistou
três iraquianos para saber quais são os seus temores e as suas esperanças.
Confira os depoimentos.
Mohamed,
28 anos, Mosul
Tudo em Mosul (norte do Iraque) está normal. As pessoas estão indo para
o trabalho e não há tantos problemas. O único incidente de que eu ouvi falar
aconteceu no sábado, quando um avião lançou dois mísseis em uma casa
abandonada. Os proprietários tinham deixado a cidade duas semanas antes do
bombardeio.
Há um problema de fornecimento de gasolina, uma vez que falta
combustível. Os carros estão fazendo longas filas em frente aos postos de
gasolina e lá permanecem por horas a fio.
Mas as condições de vida aqui são melhores do que no passado. Agora as
estradas estão abertas e nós podemos ir e voltar do trabalho mais facilmente.
Antes, o Exército costumava fechar todas as estradas que davam acesso a uma
única área, por exemplo, deixando apenas uma via aberta com um posto de
controle. Por causa disso, sempre havia congestionamento.
Eu demorava mais ou menos 30 minutos para chegar ao trabalho. Agora, só
levo cinco. Eu trabalho em um restaurante e as famílias não deixaram de
frequentá-lo. Você pode ver pessoas na rua até meia-noite.
Os insurgentes estão por toda a parte. Eles organizam o trânsito e
asseguram que os comerciantes não vendam os produtos por preços abusivos.
Em geral, a relação da população com os rebeldes é boa. Eles
participaram de duas grandes passeatas desde que chegaram à cidade. A última,
na quinta-feira, contou com apoio popular.
Os insurgentes também afirmaram que integrantes do Exército e da polícia
seriam libertados se entregassem as armas e desertassem.
Como resultado, tenho visto muitos ex-soldados e policiais que vão para
as mesquitas, onde os rebeldes se reúnem, para anunciar a deserção e se
arrepender de seus atos.
A maioria dos insurgentes é de iraquianos de Mosul. Há outros que
integram o grupo Isis e eles são, em sua maioria, árabes. Falei com um deles e
ele disse que era da Arábia Saudita. Também há rebeldes da Síria e do Líbano.
Nem sempre temos conexão à internet aqui. Isso significa que a nossa voz
é bloqueada e não podemos mostrar a verdade ao mundo.
Emad, 51 anos, Sulaymaniyah, no Curdistão
Os preços dos alimentos têm subido um pouco, já que não conseguimos
trazer mantimentos do centro e do leste do Iraque.
Com a tomada de controle da refinaria de petróleo de Baiji, foi
implementado um rodízio de abastecimento dos veículos, de acordo com a
numeração da placa. Os motoristas também só podem abastecer um máximo de 30
litros de combustível por dia, em dias alternados.
Mas, apesar disso, a crise tem unido a população curda. Se isso não
tivesse acontecido sob essas circunstâncias, o povo curdo não se uniria, mas
agora todos os povos curdos estão se voluntariando para combater a Isis.
Em certa medida, temos nos beneficiado dessa crise, uma vez que a
retirada do Exército iraquiano permitiu aos peshmerga (combatentes curdos)
reconquistar partes da nossa terra que tinham sido tomadas pelo governo central
de Bagdá.
Nós confiamos em nossos peshmerga, mas há temores de que a Isis poderia
se aproveitar dessa situação para assumir o controle de algumas pequenas
aldeias no Curdistão.
Acho que a permanência do primeiro-ministro iraquiano Nouri al-Maliki no
poder, e sua insistência em resolver a crise com o uso da força, prolongarão os
problemas no Iraque.
A única solução é dialogar com todos os representantes iraquianos -
sunitas, xiitas ou curdos - para resolver os problemas e lutar contra o Isis.
Jaffar, 27 anos, Bagdá
As pessoas em Bagdá estão com muito medo. Há menos gente andando nas
ruas. Os preços de alimentos e gás estão aumentando e a situação tende a ficar
ainda mais crítica, especialmente considerando que o mês sagrado do Ramadã
começa em duas semanas e já existe uma grande demanda por alimentos.
Há alguns confrontos nas zonas sunitas, onde os xiitas têm medo de serem
mortos por combatentes do Isis. Bagdá é de maioria xiita, mas existem algumas
áreas sunitas na cidade.
As pessoas têm medo porque o Isis mata sem pudor.
Em Bagdá, os jovens se apresentaram como voluntários para combater o
Isis, e esta é causa da fatwa (decreto islâmico) dos clérigos xiitas, que pedem
que as pessoas combatam o Isis.
É preocupante, pois há muita gente armada e não sabemos quem são essas
pessoas, nem quem são seus líderes, nem o Exército do qual fazem parte.
As mídias sociais, como Facebook, Twitter e YouTube, são oficialmente
proibidas em Bagdá porque espalham a propaganda do Isis e os ajuda a organizar
suas táticas e lutas. No entanto, podemos tranquilamente acessá-las usando
proxies e outras ferramentas de computador.
Fonte: BBC
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